Abaixo Papai Noel! Viva o menino Jesus!
O melhor da festa é esperar por ela, diz o provérbio. O melhor do Natal é ter passado por ele, sentem muitos sem dizer.
É insuportável a fissura desencadeada pelas festas de fim de ano. O consumo compulsório de produtos, o apetite compulsivo de comilança, a máscara da alegria estampada no rosto para encobrir o bolso furado, a corrida aos espaços de lazer, as estradas engarrafadas, as filas intermináveis nos supermercados, os sinos de papel envoltos nas fitas vermelhas dos shopping centers, aquela mesma musiquinha marota, tudo satura o espírito.
Seria esse anticlima um castigo divino à nossa reverência pagã à figura de Papai Noel?
Natal é pouco verso e muito reverso. Em pleno trópico, nosso mimetismo enfeita de neve de algodão a árvore de luzinhas intermitentes. O estômago devora castanhas, nozes, avelãs e amêndoas, quando a saúde pede saladas e legumes.
Já que o espírito arde de sede daquela Água Viva do poço de Jacó (João 4), afoga-se o corpo em álcool e gorduras. A gula de Deus busca, em vão, saciar-se no ato de se empanturrar à mesa.
Talvez seja no Natal que nossas carências fiquem mais expostas. Damos presentes sem nos dar, recebemos sem acolher, brindamos sem perdoar, abraçamos sem afeto, damos à mercadoria um valor que nem sempre reconhecemos nas pessoas. No íntimo, estamos inclinados à simplicidade da manjedoura. O mal-estar decorre do fato de nos sentirmos mais próximos dos salões de Herodes.
(...)
Mudemos nós e o Natal. Abaixo Papai Noel, viva o Menino Jesus! Em vez de presentes, presença - junto à família, aos que sofrem, aos enfermos, aos soropositivos, aos presos, às famílias das vítimas de crimes, às crianças de rua, aos dependentes de droga, aos deficientes físicos e mentais, aos excluídos.
Façamos da ceia cesta a quem padece fome e do abraço laço de solidariedade a quem clama por justiça. Instalemos o presépio no próprio coração e deixemos germinar Aquele que se fez pão e vinho para que todos tenham vida com fartura e alegria.
Abandonemos a um canto a árvore morta coberta de lantejoulas e plantemos no fundo da alma uma oração que sacie nossa fome de transcendência.
Deixemo-nos, como Maria, engravidar pelo Espírito de Deus. Então, algo de misteriosamente novo haverá de nascer em nossas vidas.
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